domingo, 1 de setembro de 2019

Lana Del Rey e a carta de amor aos EUA, Norman Fucking Rockwell!

O que fazer depois depois de influenciar uma geração inteira de novos artistas? Logo no lançamento do primeiro disco, Lana Del Rey cativou o público com uma estética vintage, melodramática e poética. Após cinco álbuns, a americana apaixonada lançou a maior carta de amor aos Estados Unidos e à costa oeste do país: Norman Fucking Rockwell!
Esqueça a melancolia exagerada de Honeymoon, a bateria insistente de Ultraviolence e o otimismo ilusório e surrealista de Lust For Life. Tirando tudo isso, sobra a essência da cantora: poesia grunge com vocais dóceis e os arranjos musicais mais orgânicos ouvidos em sua carreira até agora.


A sonoridade — embora tenha sido claramente idealizada por Lana — é produzida por Jack Antonoff. O americano é responsável por grandes discos, como Melodrama, da Lorde, 1989, reputation e Lover, da Taylor Swift. Enquanto ele investiu pesado em misturas pop pra estes álbuns, em Norman Fucking Rockwell!, ele buscou uma sonoridade orgânica digna dos trabalhos mais maduros dos Beatles, como Abbey Road e Let It Be.
Logo na primeira faixa, que dá o título ao álbum, é possível perceber o direcionamento mais natural do disco, com o piano como protagonista — o que acontece em diversos outros momentos. É nessa faixa inicial que Lana exubera maestria no que sempre foi destaque em sua arte: misturar uma linguagem que beira o vulgar a poesia e instrumentos orquestrais.
Mariner’s Apartment Complex confirma a suspeita que surgiu ainda no lançamento da faixa meses atrás: Norman Fucking Rockwell! é uma carta de amor à Costa Oeste dos EUA. Esta é quase uma versão mais romântica e menos melancólica do single de apresentação do disco Ultraviolence, West Coast. Ah, esse é um bom momento pra dar uma dica: NFR! é um disco pra ser ouvido em som estéreo e volume alto. São nuances demais — e cada uma merece ser apreciada singularmente.


A maior parte do disco é como se Lana e Jack tivessem estudado a discografia dos Beatles e pensado: como podemos modernizar esses sons e adicionar o tempero único da artista? Faixas inacreditáveis são a resposta, como a magnífica Fuck It I Love You, a longa Venice Bitch, o cover da banda Sublime, Doin Time e Cinnamon Girl.
Lana não deixou de reverenciar os trabalhos anteriores. Faixas como How To Disappear, California (que fala abertamente sobre um amigo próximo com depressão severa), Bartender (uma Girls Just Wanna Have Fun à moda Lana Del Rey) e The Greatest — que tem alguns dos vocais mais impressionantes da cantora até agora e conta com uma ponte arrepiante de Jack Antonoff — se encarregam disso.

Outro tema repetitivo na carreira da Lana é a comparação das relações com religião, em nível de devoção e adoração. The Next Best American Record é uma das músicas mais literais do disco, abrindo detalhes sobre um relacionamento com um músico. É com Rick Nowels — parceiro de longa data (desde Dark Paradise, no Born To Die, passando por parte de Ultraviolence e quase a completude do Honeymoon e do Lust For Life), que ela canta sobre escrever novos clássicos da música norte-americana.
A Lana tem o poder de fazer pessoas chorarem sem elas realmente entenderem o que está causando certas emoções. A última faixa, por exemplo, hope is a dangerous thing for a woman like me to have — but i have it (ufa), é uma música com um tema não necessariamente inédito no catálogo dela, mas a roupagem criada ao lado de Antonoff mexe com a respiração. Uma joia de música e ótima forma de encerrar o álbum.
Existe uma verdadeira sensação de amadorismo também no disco — e não de uma forma pejorativa. Happiness is a butterfly, por exemplo soa como se Lana tivesse chegado ao estúdio com Jack e dito “eu escrevi umas coisas ontem. Será que podemos fazer algo legal com isso?”. E isso expressa uma autenticidade refrescante — especialmente em uma era em que as músicas que tocam na rádio são feitas via e-mails e pré-produzidas antes mesmo de chegarem ao artista final.

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